Uma questão que tem sido debatida na rede é se o W3C deve endossar o padrão Extensões de Mídia Criptografada EME, que permite que uma página da Web inclua conteúdo criptografado, conectando um sistema existente de Gerenciamento de Direitos Digitais na plataforma subjacente
NETmundial, um gol de placa
Demi Getschko, diretor-presidente do NIC.br e membro do Comitê Consultivo da poliTICs. Coordenador do Comitê Executivo do NETmundial com Raúl Echeberría
Data da publicação:
Agosto de 2014
No final de junho de 2014 foi realizada a quinquagésima reunião da ICANN1, a primeira sediada em Londres. Como sempre, temas referentes à possível delegação para registro de novos nomes de domínio genéricos de topo (conhecidos no jargão da entidade como “gTLDs”) suscitaram polêmica e quentes debates, especialmente no Comitê Assessor Governamental (GAC) da entidade. O gTLD referente ao tema “vinho”, nas versões “.vin” e “.wine”, foi o embate da vez, resultando em disputas acirradas envolvendo especialmente o governo francês, apoiado por Espanha e Portugal.2
Mas em outro viés, mais amplo e certamente mais denso, ouviram-se muito os ecos e os reflexos do encontro internacional sobre governança da Internet que o Brasil sediou em abril, o NETmundial3. E a plateia acompanhou o discurso de um insuspeito e importante ministro da China4 que, em viva voz, afirmou que o NETmundial foi um sucesso claro, que houve amplo consenso entre os participantes e que a China endossava os documentos que resultaram do encontro – uma agradável surpresa e um fato concreto que aumenta substancialmente o valor dos resultados do encontro no Brasil.
É bom lembrar que o encontro foi certamente o primeiro a carregar marcantes características multissetoriais. Os mais de 850 participantes da reunião procediam de cerca de 110 países e os quatro setores dividiram o salão de forma muito equilibrada. Governos, empresas, terceiro setor, área técnica e academia participaram de forma praticamente equânime, tanto na geração do conteúdo enviado antes do evento, como na ocupação das cadeiras e dos microfones na reunião. Na leitura dos documentos finais, por sinal saudada com aplausos longos e enfáticos pelos presentes, apenas dois setores fizeram reparos. Do setor governamental, que contou com quase 100 países representados, apenas Rússia, Índia e Cuba usaram o púlpito para expressar reservas ao texto e indicar que com ele não concordavam. E vinda do terceiro setor, fartamente representado, houve uma manifestação de dissenso que, contanto haver elogiado o processo que gerou o documento, resolveu retirar seu apoio ao documento em si.
Dois documentos foram gerados no NETmundial: o que trata dos Princípios a serem defendidos para uma Internet aberta a todos, inclusiva e livre, e uma abordagem do que seria o “mapa do caminho” (roadmap) para evolução do ecossistema de gestão e governança da rede. O primeiro dos documentos é claramente uma consequência também de documentos e trabalhos anteriores, como é o caso do “decálogo” que o CGI.br gerou em 2009.
O conjunto de princípios do CGI.br teve reforço fundamental no discurso que a presidenta Dilma fez na abertura da Assembleia Geral da ONU onde, além de explicitamente citá-los, instou outros países a trabalharem sobre o tema, buscando um consenso que independe de legislação internacional e se baseie em conceitos que possam ser ratificados pela comunidade internacional.5 Já o “mapa do caminho” pode ser identificado com a necessidade de progressiva e rápida desvinculação de algumas atividades de coordenação central, historicamente ligadas ao governo dos Estados Unidos, e assinaladas pela Declaração de Montevidéu.6 Pode-se citar, por exemplo, o contrato que existe entre NTIA, IANA e a empresa Verisign7 para a manutenção e evolução do conteúdo da raiz de nomes de domínio da rede (servidores-raiz do DNS). Também nessa área os resultados parecem promissores, com o anúncio de que a NTIA pretende encerrar seu papel de “avalista” nas alterações que são solicitadas e executadas na raiz de nomes por meio da IANA.
Assim, em Londres vimos a China apoiando os Princípios da Internet, e a NTIA/EUA apoiando o “mapa do caminho” ao admitir uma transição em seu papel. Certamente há muito que comemorar, mas também há muito trabalho pela frente. Iremos a Istambul, a histórica Constantinopla, no crucial cruzamento do Ocidente com o Oriente, participar do nono Fórum de Governança da Internet da ONU8, com a esperança de que a Internet será mantida e aperfeiçoada no seu importantíssimo papel de unir povos, preservar culturas, disseminar ideias. Somos otimistas!
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1. Corporação da Internet para Designação de Nomes e Números. Ver https://www.icann.org
2. Sobre o assunto a secretária de Estado dos Assuntos Digitais da França, Axelle Lemaire, endereçou uma carta formal à ICANN contestando as práticas de aprovação de gTLDs da entidade – ver https://www.icann.org/en/system/files/correspondence/lemaire-to-icann-bo...
3. Ver http://netmundial.br
4. Lu Wei, ministro da Administração dos Assuntos do Ciberespaço da China.
5. O discurso completo está em apêndice.
6. A Declaração de Montevidéu sobre o Futuro da Cooperação na Internet está em apêndice.
7. A Agência Nacional de Informações de Telecomunicação, do Departamento de Comércio dos EUA, é contratante da ICANN para a execução das funções IANA – governança de nomes de domínio, números IP e protocolos de comunicação da Internet. Sobre a IANA, ver https://www.iana.org
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